PRIVACIDADE X INTERESSE PÚBLICO

Informações de usuários em relação ao caso Marielle Franco e a decisão do STJ proferida em 26/08/2020

            Em fevereiro de 2019, a 4ª Vara Criminal da Comarca do Rio de Janeiro determinou ao Google o fornecimento de informações sobre quem transitou por certos locais do Rio de Janeiro, a partir dos dados de busca e de acesso em seus aplicativos.

            A empresa (Google) apresentou recurso ao STJ, argumentando que a medida não pode ser determinada de forma genérica, sem a identificação precisa dos usuários que se pretende investigar.

            A 3ª Seção do STJ, por maioria, negou provimento ao recurso. Em síntese, os argumentos adotados pelo relator, Min. Rogério Schietti, foram:

  • Não há desproporcionalidade na medida decretada, considerando as particularidades do caso. Além da atividade parlamentar, a vítima exercia forte atuação na defesa de direitos humanos. “Tudo indica tenha sido também motivado porque essa pauta era conduzida por uma mulher, vinda da periferia, negra e lésbica – ingredientes que, em uma cultura patriarcal, misógina, racista e preconceituosa, potencializaram a reação de quem se sentia incomodado”.

  • O direito ao sigilo não é absoluto, admitindo-se a sua restrição quando imprescindível para o interesse público.

  • Há distinção conceitual entre a medida decretada e a interceptação. Para o Ministro, a identificação dos usuários de aplicativos em determinado perímetro geográfico não permitirá o conhecimento sobre o teor de suas comunicações.

  • Os artigos 22 e 23 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet)[1] não exigem, para o fornecimento de registros de conexão ou acesso, a individualização das pessoas.

            Assim, com base nesses fundamentos, a decisão da 4ª Vara Criminal da Comarca do Rio de Janeiro foi mantida.

            Agora, uma pergunta que vai além da decisão do STJ: é possível, em tese, a rediscussão do tema junto ao STF com base na Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018)?

            O art. 1º da LGPD define o seguinte âmbito de aplicação da norma: para o “tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.

            O art. 17 da LGPD, por sua vez, estabelece que “toda pessoa natural tem assegurada a titularidade de seus dados pessoais e garantidos os direitos fundamentais de liberdade, de intimidade e de privacidade”

            A partir desses dispositivos e da garantia à privacidade, poder-se-ia admitir, em tese, a possibilidade de que até mesmo os titulares dos dados afastados pela decisão do STJ questionassem a medida junto ao Supremo.

            Ocorre que a LGPD prevê expressamente que os seus dispositivos não serão aplicáveis ao tratamento de dados pessoais realizado para fins exclusivos de atividades de investigação e repressão de infrações penais (art. 4º, III, “d”).

            O tema tem grande importância prática e também para provas de concursos públicos, especialmente porque a Lei Geral de Proteção de Dados não teve a sua vigência prorrogada pelo Senado Federal.

Fontes:

[1] Art. 22. A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet.

Parágrafo único. Sem prejuízo dos demais requisitos legais, o requerimento deverá conter, sob pena de inadmissibilidade:

I – fundados indícios da ocorrência do ilícito;

II – justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou instrução probatória; e

III – período ao qual se referem os registros.

Art. 23. Cabe ao juiz tomar as providências necessárias à garantia do sigilo das informações recebidas e à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem do usuário, podendo determinar segredo de justiça, inclusive quanto aos pedidos de guarda de registro.

O art. 1º da LGPD define o seguinte âmbito de aplicação da norma: para o o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.

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